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Wednesday, September 28, 2011

Elefante sobre o Epte: cresce a organização para amplificar o som das big bands



"Qual banda nacional ou internacional você mais admira?”, perguntou a repórter Andréa Fischer a Luís Fernando Veríssimo, para o texto de capa da revista TopMed Magazine, de abril, maio e junho de 2011. “São muitas. Só estou um pouco desatualizado em matéria de jazz. Sempre digo que só confio em músicos de jazz que estejam mortos há pelo menos cinco anos”, respondeu. Ele é modesto. E muito bem humorado!

Na foto publicada na página que ilustra a pergunta, ele sorri, de leve, abraçado ao saxofone. “Você ensaia com o grupo ou separado?”, perguntou a repórter. “Ensaiamos nas apresentações. Me envergonho de dizer.” Boa parte do jazz, ou música instrumental, ou música instrumental brasileira - ou seja lá o nome mais apropriado - tem essa característica: "ensaiar" ao vivo. Existe, geralmente, um tema, que é o que pode fisgar o ouvinte e, ao longo da música, os músicos improvisam. É só combinar a regra.

E tem mais gente “ensaiando” ao vivo. Só para citar um caso: o Movimento Elefantes, que reúne dez big bands, que se apresentam com maior frequência no Teatro da Vila, em São Paulo. “Big” porque realmente são bandas imensas, com naipe de metais, bateria, percussão, guitarra, piano e o que mais puder entrar. Além de desenvolverem repertório autoral, colocam em prática composições de músicos consagrados.

Recentemente, por exemplo, o movimento lançou um disco com uma música de cada banda. Em 2009, haviam lançado um DVD, quando o Elefantes reunia nove bandas. A Banda Urbana foi a escolhida para abrir o disco com a música “Casa da Sogra”, composição de Léa Freire e arranjo do trompetista Rubinho Antunes, que agora torce para o São Paulo em Paris. A banda Savana, comandanda pelo maestro Branco, apresenta no disco o “Ponteio da Savana”, composição feita em homenagem à banda pelo maestro Edmundo Villani-Côrtes.

Na sequência: Projeto Meretrio com “Os primeiros serão só os primeiros”, composição e arranjo de Emiliano Sampaio; Orquestra Heartbreakers, “Não se aborreça”, composição de Guga Stroeter, Patricia Secchis e Yaniel Matos, com arranjo de Dino Barioni; Reteté Big Band, “Remember Pastels”, composição e arranjo de Thiago Alves; Banda Jazzco, “Sambalombra”, de Amador Bueno; Projeto Coisa Fina, “Dia Seguinte”, de Vinícius Pereira, com arranjo do próprio Vinícius e Vittor Cáffaro; Grupo Comboio, “Samba Pra Dori”, composição e arranjo de Rui Barossi; Soundscape Big Band, “Circlos”, de Gustavo Bugni; e a Big da Santa, com “Duda no Frevo”, de Senê e arranjo de Paulo Tinê.

O grande problema: ouvir um disco não é a mesma coisa que estar de frente a uma orquestra, quebrando a barreira imposta pela reprodutibilidade técnica de um disco. Um amigo frequentemente usa um exemplo importante sobre a música ao vivo: é o mesmo que entrar na água. A que Claude Monet pintou no quadro “Canoa sobre o Epte” está sempre em movimento. Mas só ao vivo é possível perceber isso. Abaixo, a entrevista feita por e-mail com Vinícius Pereira, o principal líder do movimento, que discute aqui as dificuldades em colocar o Elefante para navegar por vários outros rios.

"Desaprendemos a gastar com cultura"
O Movimento Elefantes foi criado para dar força às big bands e divulgar essa sonoridade para um maior número de pessoas. É possível mensurar essa exposição? Quantos shows foram feitos no primeiro ano de existência do movimento, quantos shows são feitos hoje?

Vinícius Pereira - Uma média de 65 shows por ano somando o Teatro da Vila, mais as temporadas fora (SESCS e afins) sem contar os shows fechados individualmente pelas bandas.

Há alguma ideia sobre o número de pessoas que já tiveram acesso ao som de cada uma das 10 bandas?

Vinícius Pereira - No Teatro da Vila a média é de 60 pessoas por show. 44 shows por ano. No Museu da Casa Brasileira (ano passado foram 10) a média foi de 450 por show. Fora Virada Cultural, Carnaval na Contramão, virge... num sei te dizer!

Disco e DVD são importantes para difundir o som. Mas nada substitui um show. Em sua opinião, porque parece ser tão difícil levar o Movimento para outras cidades, outros Estados, considerando, claro, que há sempre uma ou outra banda com participação de festivais importantes, como a Mostra Internacional de Música de Olinda (Mimo), que você participou com o Projeto Coisa Fina recentemente.

Vinícius Pereira - Por que desaprendemos a gastar com cultura. Substituímos a arte pelo entretenimento. Então pagamos um valor fixo mensal pelo canal de TV ou pelo acesso à NET. Fui assistir a um show incrível da Léa Freire na Casa do Núcleo, R$ 20,00 eu + R$ 20,00 a patroa. Em uma horinha e meia gastamos quarentão. É uma grana. Mas foi um puta show. Foda. Eu to reclamando de R$ 40, mas na semana passada fomos jantar com uns amigos numa pizzaria lá e a nossa parte ficou em R$ 80... Mas na hora ninguém reclamou...

O povo tá mal acostumado. Só assiste show de graça. O governo subsidia as apresentações artísticas e o SESC também. Por um lado é ótimo, o artista tem trabalho. Agora quando eles param de subsidiar, ou quando julgam caro o seu produto, você não se apresenta, por que o público foi educado a não pagar por arte, por que tem de graça. O público paga por entretenimento...

No pague quanto vale no Teatro da Vila a média de arrecadação tem sido “R$ 2,41 por pessoa”... Ou seja: precisamos reeducar as pessoas a investir em arte. É um processo que temos de viver e contar também com a ajuda daqueles conscientes, a ajudar a levar os amigos a viver a experiência do ao vivo, para ver que vale o investimento! Eu mesmo não saia de casa para ver um show a meses... depois do show de ontem (20/09), da Léa, me inspirou a ir hoje ver o Zé Menezes (que já está com 90 anos! www.zemenezes.com.br - integrou o Sexteto Radamés Gnatalli e se apresentava com o Garoto) e sexta ver o Laércio de Freitas!!! (pianista, maestro e arranjador - http://www.maritaca.art.br/laercio.html e http://www.myspace.com/laerciodefreitas)

É tão prazeroso ouvir o som do instrumento do cara, não é uma reprodução, não é o ponto de vista do cameraman, é o meu ponto de vista, audição, olfato e de todos os outros sentidos que não conseguimos catalogar. Mas voltando ao tema das bigs no interior, quanto custa contratar uma big band? Cachê de 15 músicos, transporte, hospedagem, alimentação, produção, impostos... Com o custo da apresentação de uma banda dá pra quase fazer um mês de programação com trios a quintetos...

Além de o show ser mais vivo, que outras qualidades um show pode proporcionar? Exemplo: uma coisa é ouvir com fone de ouvido o disco, ou ouvir e ver na TV o DVD, outra é entrar no mar... Uma coisa é ver o carnaval na TV, por exemplo, outra é fazer parte da bateria... Pode falar algo sobre essa relação da tecnologia fazendo a mediação com os sentidos?

Vinícius Pereira - O que acontece no palco depende do que acontece na platéia. O público tem um papel fundamental no resultado musical de qualquer apresentação. Quando o músico está inteiro, realmente envolvido com a música que está fazendo, é inevitável o público sentir tudo isso e gerar sensações indescritíveis que o público manisfestará ao final da música seja com aplausos, gritos, assovios etc... Quando essa energia volta pro palco o músico percebe que sim, que não era coisa da cabeça dele, acontecetu arte ali mesmo e isso o deixa mais seguro e à vontade para se deixar levar mais, para se deixar tomar por aquela coisa que não dá pra descrever e deixar acontecer arte na frente de todo mundo.

Quanto mais o público está inteiro na apresentação, mais encorajado o artista se sente para despirse diante dele e se arriscar a dizer o que sabe e o que não sabe, a deixar seu corpo se transformar numa ponte entre o objetivo e o subjetivo, entre o cá e o lá, e toda essa energia só prova quem está lá. Assim como a TV não transmite o maravilhoso aroma do perfume daquela atriz, não transmite também essa energia toda que acontece ao vivo. Transmite todas as notas. Mas a energia...

Não seria o caso de buscar recursos, por meio de crowdfunding, por exemplo, para conseguir concretizar algum projeto de apresentação das bandas do movimento em coretos pelo interior do Estado? Ou promover um contato com diretórios acadêmicos para realizar apresentações em universidades?

Vinícius Pereira - Pretendemos realizar diversos tipos de projetos de circulação de shows, com os mais diversos parceiros e plataformas de financiamentos. Mas antes, decidimos organizar a casa. Estamos a 3 anos vivendo na informalidade total e agora decidimos que chegou o momento de arrumar a casa, criarmos uma pessoa jurídica para podermos nos inscrever em editais, etc. Estamos elaborando o estatuto da nossa associação!!! Com isso pronto começaremos a buscar parceiros pra nos ajudar a fazer a coisa circular pra valer! E vai dar certo, tenho certeza.


Arte do Elefante sobre o Epte Muito Bem Acompanhado é do menino MTC; foto desfocada da Reteté é do arquivo pessoal de Roger Marzochi; foto do maestro Branco obtida no site da Savana; foto do Projeto Coisa Fina obtida no site da banda.

1 Comments:

Anonymous Mariana (Cafezinho) said...

Muito legal Roger!!!!Parabéns!!!!!

Virei sempre olhar seus textos. E continue indo tomar uma xícara desse cafezinho - jornalista... rs

Toda semana ele tem uma historia nova pra contar!

Abs!

Mari

10/04/2011  

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