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Blog para divulgação de artigos e textos jornalísticos que transgridam o conceito do jornalismo online.

Friday, January 18, 2008

Janelas



Talvez o segredo da vida esteja numa sombra na parede. À noite, sentado no sofá da sala, luz apagada, de costas para a janela, você olha na escuro da parede a imagem e o contorno nítidos da janela, do lustre, de folhas de árvores projetadas pela luz da rua. De repente, percebe que aquilo alí, estampado na sua frente, não é só uma sombra, mas uma nova janela, para uma outra rua, para um outro tempo. Para o dia que complementa a noite, ou para o outro lado do dia. Sentir isso é como um presente para a alma atribulada pela percepção por demais concreta do real.

Passado, presente e futuro parecem uma só linha olhando do alto a transcendência das luzes e sombras, assim como vê o astronauta a Terra: uma esfera majestosa, solta no espaço sideral como se nem as leis da física a pudesse dar rumo (ou porque nem as leis da física ainda conseguem explicar que rumo é esse). Mas que, apesar de seus mistérios e inacreditável beleza, aqueles que a habitam desconhecem sua grandiosidade, perdidos demais com as barreiras do dia-a-dia, com a avareza, a imensurável ambição. Que a janela para além daquela sombra traga, a todos, sensatez.

Imagens copiada do site: http://www.fotodependente.com/data/media/55/A_janela_mgica.jpg

Tuesday, January 08, 2008

Pede prá viver!

Os fogos de artifício que iluminaram a noite do dia 31 de dezembro de 2007 estiveram longe de anunciar a chegada de um ano novo. Muda-se a data, mais ficam os temores e torturas nas almas citadinas, como se até Deus tivesse se transformado em fã do capitão Nascimento: afogando a cabeça dos viventes num tonel frio de realidade bruta, ou sufocando-a num saco plástico para aflorar sua essência líquida. Em meio à tortura, Deus, sádico, grita! “Pede prá viver!, Pede prá viver seu zero dois! O mundo não aceita cidadão corrupto, seu zero dois!”

Pobre Deus. Terá que torturar mais quantos homens e mulheres para perceber que a vida tem sido, por si só, a corrupção dos sentidos? No cinema, o melhor filme brasileiro do ano passado, o “Tropa de Elite”, criou polêmica por permitir o espelhamento mais que perfeito do imaginário coletivo. O policial foi humanizado, “atomizado” na máscara social. Ele é pai, é marido, é pobre, é soldado que não aceita a corrupção policial com o crime que, legalmente ele deve combater. Policiais, suas famílias e simpatizantes, que vivem sob esse espectro da realidade, aplaudiram. E no combate cego ao seu objetivo, ele tem os sentidos corrompidos. Tortura e mata para cumprir a ordem pública.

Quer mais corrupção de sentidos que ver o capitão Nascimento ser transformando em herói nacional, e o Bope, o paraíso ético da lei, embora o diretor do filme tenha dito que não era essa a sua intenção? Mais corrupção dos sentidos que ver o personagem do filme posar de garoto propaganda de uma marca de cerveja, a droga legalizada?

O estudante bem intencionado, que participa de ONGs e quer “mudar o mundo”, transpirando um misto de explosão de hormônios, descoberta da vida e consumismo, permite-se burlar regras. Ao menos quebrar determinadas regras sociais deveria ser uma das principais marcas da juventude. Mas se corrompe ao fazer do vício um modo de vida e, por ele, chega a ser praticamente cúmplice de assassinato.

Mas se pode viver bebendo cerveja até morrer! “Mata?”, pergunta a garçonete da publicidade de cerveja ao ator que interpretou o Capitão Nascimento. “Quem?”, questiona ele, ávido por sangue. Ela olha para a garrafa, e ele prova um pouco do seu veneno em álcool. O imaginário coletivo, portanto, está corrompido. Qual o grau de periculosidade entre cerveja, uísque, cocaína, maconha, extasy, ópio? A juventude não quer saber. “Nunca antes neste país estivemos tão ‘não tô nem aí’!”, exaltariam. E é com esse desleixo com a vida, o foco excessivo no consumismo e na individualidade, que os jovens alimentam o tráfico dos sentidos, muito mais grave que o de drogas.

É triste perceber que há toda uma guerra no País simplesmente porque não se consegue equilíbrio químico. Vivemos cercados de droga, mas o que define o seu risco à saúde e à sociedade é a dose. Quase todas as drogas ilícitas já se industrializaram e podem ser encontradas em qualquer esquina do País. Deixaram o plano da transcendência hippie para o do consumismo e da fuga. Este é o ponto. Mas o ponto se desloca para quem lucra com a venda de um produto ilegal. Uma questão que está intrinsecamente ligada à saúde pública, transforma-se numa guerra entre o Estado e seus publicitários e os capitalistas do tráfico com os seus promoters, alimentando interesses comerciais e, quem sabe políticos, de ambos os lados e causando mais vítimas que qualquer uma das guerras. Sem o fim do tabu às drogas legais e ilegais, a população continuará implorando para viver em meio à guerrilha urbana.